segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

O ex-presidente Lula era popular fora do Brasil também e isso ajuda.


Quando o assunto é marca, o Brasil deveria aprender com seus jogadores de futebol

Para o especialista em marketing internacional Tamer Cavusgil, o Brasil precisa aparecer e crescer – nessa ordem mesmo

Daniela Almeida
Reprodução Internet
Tamer Cavusgil, economista e especialista em marketing internacional da Georgia State University (EUA) (Foto: Divulgação)
Sabe o que o jogador de futebol Neymar, a super modelo Gisele Bündchen e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva têm em comum? Eles ajudam a construir a marca “Brasil”aos olhos do mundo.

Mas na opinião de Tamer Cavusgil, economista e especialista em marketing internacional da Georgia State University (EUA), eles não são suficientes.

Autor de doze livros e 180 artigos sobre o assunto, Cavusgil alerta: “embora a marca nacional do país seja forte, a marca corporativa não é.”

Segundo o ranking desenvolvido na Geogia University, o Brasil ocupa a quinta posição entre os países em desenvolvimento. E mesmo isso ainda não é o suficiente para atrair empresas (e negócios, e investimentos) para cá.

Essa marca é uma das maiores vantagens que o Brasil carrega frente a outros emergentes como a China. Na opinião de Cavusgil, os consumidores compram dos chineses por uma única razão, o preço baixo. Quando eles começarem a subir – o que já está acontecendo –, passarão a comprar de outro país. Isso, segundo a análise de Cavusgil, porque a imagem dos chineses é de “manipuladores, fechados, desonestos e oportunistas” perante ao mundo. O Brasil, pelo contrário, não sofre desse mal.

Onde está o problema? Na burocracia, nos altos impostos e no sistema confuso onde abrir e fechar uma empresa é quase uma peregrinação e... na fraca imagem corporativa que o Brasil tem perante outros países e empresas. O que falta ao país, para o especialista, é um belo plano de marketing, com companhias brasileiras aparecendo no mercado internacional, executivos daqui liderando empresas de lá e até mesmo mais estudantes nas universidades fora do país. Em outras palavras, é preciso aparecer para conseguir crescer.

Qual sua avaliação da marca “Brasil” no cenário internacional? O país é 21º lugar em marcas nacionais e é visto pelo resto do mundo com uma boa reputação, dono de belezas naturais, povo amigável, sol, praias etc. Embora a marca nacional seja forte, a marca corporativa não é. Há mais jogadores de futebol conhecidos internacionalmente que companhias brasileiras.

Como tornar o país uma marca forte?
Com certeza há algumas lições a serem aprendidas com estes jogadores de futebol. Como eles se tornaram marcas reconhecidas mundialmente, a ponto de todo mundo em qualquer lugar do planeta conhecer o futebol brasileiro? É necessário criar empresas internacionais como a Embraer, a BR Foods e a Natura e divulgá-las. Vocês também precisam de mais celebridades mundiais, não apenas nos esportes, mas nas artes, em cultura e, claro, nos negócios. E vocês os têm.

O senhor se refere a lideranças políticas?
O ex-presidente Lula era popular fora do Brasil também e isso ajuda. Você pode criticá-lo, dizer que ele não foi o melhor ou perfeito, mas ele era um personagem. Esse tipo de celebridade consegue a atenção da imprensa e, logo, chama a atenção de vários países. Mas vocês precisam de embaixadores internacionais e não falo de diplomatas. Falo de brasileiros estudando fora, executivos trabalhando para empresas em outros países. Vocês precisam aparecer, ter uma presença mundial, precisam estar lá. Isso requer um esforço organizado.

Por exemplo? Por exemplo, o filme Rio que foi visto por muitas pessoas na Europa e Estados Unidos recentemente. Vocês precisam agradecer ao diretor do filme, o Carlos Saldanha. A publicidade que o filme gerou em apenas um filme, custaria bilhões ao Brasil. De repente, as pessoas ganharam simpatia pelo país e pelo bom humor brasileiro, estão ansiosas para fazer turismo no Brasil. Todas essas coisas aconteceram com apenas um produto. A pergunta é: como fazer mais disso?

Mas como fazer isso de forma sistematizada?
Todo mundo compete em commodities. Há muito mais espaço para outros setores. Quer um exemplo? O mundo sabe que há um monte de cirurgiões plásticos no Brasil. Isso tem trazido uma série de pessoas fazendo turismo médico para cá. Talvez isso possa ser feito de maneira mais sistemática. Não é algo novo, mas pode ser uma oportunidade. E oportunidades como esta precisam ser mapeadas em um estudo que identifiquem o que o Brasil tem a oferecer, quais são as demandas mundiais e, por fim, como fazer propaganda disso para o mundo.

Como as recentes quedas de ministros no governo Dilma foram interpretadas internacionalmente?
A corrupção está por todo lado, nenhum país está imune. Mas quando você tem três ou quatro ministros sendo demitidos ao mesmo tempo, isso vira notícia internacional. E os empresários lêem isso e ficam um tanto quanto preocupados. Isso também impacta na percepção das empresas e reflete nas decisões de virem ou não para cá.

Nesse processo de construção de marca, qual o diferencial do Brasil em relação a outros emergentes?
Há muitos países que não têm os atributos do Brasil. As pessoas compram da China, mas no momento em que eles passarem a aumentar seus preços – e eles já estão fazendo isso – eles deixarão de comprar. Os consumidores não têm a mesma simpatia pela cultura ou o governo chineses. Eles enxergam os chineses como manipuladores, fechados, desonestos, oportunistas etc. O Brasil não tem essas desvantagens, pelo contrário. Ele tem uma imagem muito mais carismática que muitos países emergentes.

Qual o peso da Copa e das Olimpíadas como vitrine?
Isso não tem preço! Esse é o momento ideal para o Brasil empenhar uma campanha de cinco ou seis anos para se promover. Para promover tudo no país: os produtos, os empresários que estão se dando bem lá fora, os líderes de negócios, a tecnologia, o know how. Empresas como Natura, Embraer, Odebrecht podem servir como um cartão visita para negócios. É um momento único na história de um país. Digam ao resto do mundo porque o Brasil é um bom lugar estar.

Há grande onda otimista em relação ao Brasil por parte das empresas internacionais. Ao quê o senhor credita isso?
Alguns fatores positivos jogaram a favor do Brasil recentemente. Realizações do governo Fernando Henrique e, depois, do governo Lula aliadas a um bom período de crescimento da economia mundial. O timming foi positivo. Além disso, houve a alta no preço de commodities e empresas nacionais se internacionalizaram, como a Embraer, Vale, Natura e BR Foods. Mas em termos de crescimento da classe média, não há uma expectativa que essa fatia da sociedade aumente mais rápido no Brasil que na Rússia, que vive um momento no qual está ascendendo muito.

Quais os limitadores, na visão dessas companhias?
O país tem uma regulação excessiva. Para os estrangeiros, o Brasil não é um lugar fácil de transitar. Obter licenças, aprovações, abrir um negócio, fechar um negócio são ações burocráticas, que consomem tempo e dinheiro. Os impostos, além de caros, são difíceis de entender para as empresas internacionais. De acordo com o Banco Mundial, o Brasil é o 126º lugar no ranking dos países onde é mais difícil de fazer negócios. A quantidade de talentos, de engenheiros e cientistas treinados e qualificados também não é grande. Quando você instala uma empresa precisa de boa educação, universidades e escolas técnicas. As companhias olham para essas características, que se traduzem altos riscos e custos, e acabam escolhendo outros destinos, como Indonésia, México, Malásia, Coréia do Sul ou Turquia.

Tendo isso em vista, o volume de empresas se instalando no Brasil deve continuar aumentando?
O que vocês estão experimentando é bem típico. Mas posso garantir que está acontecendo até de maneira mais forte em outros emergentes como a China, Coreia do Sul e Turquia. Por que eles estão vindo? Pela sua classe média ascendente, pelo seu mercado consumidor. A automotiva é a primeira indústria a chegar porque há uma fascinação em relação a isso. Em segundo lugar, a de comida. A terceira é a da educação – a classe média brasileira está investindo muito em educação, mais do que outros mercado emergentes. A questão é como conseguimos atrair mais delas, como fazer com que elas invistam, exportem e como colocar os brasileiros nessas empresas.

Por que o senhor acha importante ter brasileiros nessas organizações?
É tudo questão de transferência de know how. Nas empresas multinacionais, você percebe que é tradicional que os presidentes e CEOs sejam sempre de algumas nacionalidades dominantes. Eles são geralmente suíços, australianos, britânicos. Você não encontra muitos brasileiros liderando grandes empresas multinacionais. Há alguns, mas poderiam ser mais. Isso ajuda a desenvolver novos talentos, os quais podem voltar pra casa com um know how que ajudaria a desenvolver a economia brasileira. Os brasileiros amam o Brasil por boas razões, mas poucos gostam da ideia de trabalhar como expatriados em companhias estrangeiras. Isso provavelmente se aplica a empreendedores e sua visão de negócios. Por isso não há essa visão globalizada.

Então, é um problema cultural?
Sim, percebemos isso entre os estudantes brasileiros. Não vemos muitos de vocês fazendo uma pós-graduação nos Estados Unidos, Austrália, Inglaterra ou Europa, por exemplo. Isso não requer dinheiro, pois há muitas bolsas disponíveis. Um ano ou dois estudando fora transforma as pessoas. Você não só aprende sobre uma cultura em específico, como entra em contato com outras culturas. Eles também voltam com a confiança de que podem competir com coreanos ou europeus. Eles voltam e se tornam líderes em negócios e tem aspirações de levar suas empresas para fora. Ensino há 40 anos e posso dizer que ensinei menos de dez brasileiros. Ouvi recentemente que o governo enviará 30 mil jovens para estudar fora. Essa é uma boa medida.


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